sexta-feira, 9 de novembro de 2012

"Bom não é renovar, bom é melhorar", diz Rubens Figueiredo

Via Revista Exame.

Cientista político analisa o resultado das eleições municipais do último domingo no Legislativo paulistano e explica por que ex-policiais foram tão bem votados

Kamila Hage, de VEJA.

A Câmara dos Vereadores de São Paulo terá na próxima legislatura uma taxa de renovação de 40%, garantida pelas eleições do domingo. Candidatos tradicionais, conhecidos pelo envolvimento em episódios escusos da política paulistana, não foram eleitos. Um deles é Vicente Viscome, do PRP. Chefe da Máfia dos Fiscais, ele foi o primeiro vereador cassado da história de São Paulo, em junho de 1999, e cumpriu sete anos de prisão. Mesmo assim, driblou a Lei da Ficha Limpa e tentou ressuscitar a carreira política ao se candidatar a uma vaga na Câmara em 2012. Fracassou.

Novas figuras, contudo, despontaram. Coronel Telhada (PSDB) estreou na política neste ano e foi o quinto vereador mais votado de São Paulo, com 89.053 votos. O ex-capitão da Rota, a elite da polícia paulista, gosta de citar o lema de que “bandido bom é bandido morto”. Conte Lopes (PTB) e Álvaro Camilo (PSD), outros ex-policiais linha dura, também foram eleitos.

“A sociedade está muito mais rigorosa com o crime e busca punição aos bandidos. Isso se reflete na expressiva votação nesse tipo de candidato”, afirmou ao site de Veja o cientista político Rubens Figueiredo, diretor do Centro de Pesquisas e Análises de Comunicação (Cepac). Leia os principais trechos da entrevista:

- A bancada evangélica na Câmara passou de cinco para oito representantes. Por outro lado, Celso Russomanno, candidato a prefeito ligado à Igreja Universal, desidratou e não chegou ao segundo turno. Como o senhor analisa esse fenômeno?

Rubens Figueiredo: Os evangélicos têm uma capacidade de mobilização muito maior do que a de políticos de outros grupos. Além de comungarem da mesma fé, eles se encontram regularmente e detêm meios de comunicação. Por isso, são candidatos fortes em campanhas proporcionais. Ao longo do tempo, esse grupo tem aumentado sua influência. E formam uma bancada pluripartidária, já que os evangélicos estão em vários partidos e nem sempre guiam sua atuação por questões religiosas.

- Como você explica a eleição de ex-policiais, como Coronel Telhada, Conte Lopes e Álvaro Camilo?

Figueiredo: A sociedade está muito mais rigorosa com o crime. Pesquisas indicam, por exemplo, um número muito grande de pessoas que desejam a diminuição da maioridade penal. A votação expressiva nesses policiais vai ao encontro do que a sociedade quer: punição, bandido na cadeia, justiça ágil. A eleição desses vereadores está em consonância com essa corrente de opinião. Ou seja, você tem espaço para esse tipo de candidato porque a sociedade está, cada vez mais, buscando uma ação eficaz da justiça e da polícia.

- O candidato a vereador mais votado dessas eleições, Roberto Trípoli, do PV, tem como principal bandeira a defesa dos animais. O paulistano está mais sensível a essa causa?

Figueiredo: A questão dos animais tem poucos representantes entre os vereadores e deputados. Em contrapartida, metade lares paulistanos têm animais de estimação, o que representa um número muito alto. Trípoli foi o idealizador do primeiro hospital público veterinário da cidade. Isso teve uma repercussão muito grande. Um serviço novo para a população, aliado ao fato de que existe uma quantidade relevante de pessoas que têm animais, explica o enorme número de votos que ele recebeu. Ele é um candidato temático, cujo tema atinge uma quantidade enorme de pessoas.

- A mudança de 40% dos vereadores representa um avanço de qualidade na Câmara?

Figueiredo: O bom não é renovar, o bom é melhorar. Se você tem candidatos que fazem apologia à violência eleitos, a mudança não é boa. Não é por esse caminho que países democráticos avançam. Costumamos ter a ideia de que renovar é sempre positivo. A renovação não é, necessariamente, o melhor caminho.

- Na eleição de 2008, a taxa de renovação foi de 29%. Por que agora foi mais alta?

Figueiredo: Em 2008 houve uma continuidade porque a sociedade vivia uma euforia de consumo, de crédito, e de crescimento econômico. As pessoas estavam viajando de navio, de avião. Isso acabou. Hoje as pessoas estão pagando o carro que compraram naquele ano. Em 2008, os orçamentos municipais cresceram muito, então o governo conseguia realizar muito mais. Agora o cenário se inverteu. Isso explica uma tendência geral para mudanças, incluindo o cargo de prefeito.

- O PT elegeu a maior bancada, somando onze representantes. É um indicativo de como se definirá o segundo turno para prefeito?

Figueiredo: A disputa será difícil, mas eu não creio que haja uma tendência de avanço do PT por causa da bancada de vereadores eleita. A votação nesses candidatos a vereador não se deu por causa do partido, mas sim devido a campanhas individuais bem feitas. Ao contrário, a simpatia pelo PT diminuiu depois do início do julgamento do mensalão.

- Depois da eleição do palhaço Tiririca como deputado federal mais votado de São Paulo em 2010, personalidades como o cantor Agnaldo Timóteo não se reelegeram este ano. O apelo de famosos no meio político está perdendo o fôlego?

Figueiredo: Sim, está diminuindo. Passada a euforia do início da candidatura de famosos, as pessoas começam a perceber, em São Paulo, que cargos públicos devem ser ocupados por quem está disposto a trabalhar. Com o fim da novidade, o fenômeno tende a diminuir.
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